Assisti recentemente, em rede nacional, uma entrevista com a dupla de “Os caras de pau”. Leandro Hassum, emocionado, disse que sofreu bullying na escola e para se defender usava o humor. E foi tão efetivo em sua atitude que desenvolveu um grande talento. Uma verdadeira educadora da escola que frequentava – e onde sofria o bullying – orientou-o a fazer teatro, e o sucesso veio como consequência.
Este fato reforça e valida o que eu havia dito, há pouco tempo, em uma reunião de Pais e Mestres do Colégio Viktor Frankl: ao lidar com o bullying devemos não só trabalhar com o agressor, mas também com o agredido.
Com o agressor podemos utilizar, sobretudo, o diálogo socrático, levando-o a refletir sobre as alternativas de atitudes que teria tido antes da situação de agressão e as consequências, o sentimento após cada atitude. Através da imaginação, lançá-lo em uma perspectiva futura, vendo as consequências de cada atitude no presente, colocando-o diante da possibilidade de escolha do rumo de sua vida. Também é importante trabalhar a dimensão da alteridade, questionando-o, por exemplo: o que você gostaria que o outro lhe fizesse caso você estivesse no lugar dele?
Com o agredido, é fundamental fortalecê-lo em sua capacidade de responder às adversidades, desenvolver seu potencial resiliente. Resiliência é a capacidade humana para defrontar, superar, sobrepor-se e ser fortalecido ou transformado por experiências de adversidade; a capacidade de transformar uma adversidade em estímulo, em oportunidade de realização criativa, de realização de sentido. Como no exemplo citado, Leandro, a partir das adversidades, desenvolveu habilidades potenciais. E o humor é um instrumento poderoso para nos ajudar a criar distância da situação adversa e enxergar soluções escondidas. Precisamos educar jovens e adolescentes despertando-os para a capacidade de dirigir sua própria vida, para enfrentar e solucionar problemas, para assumir responsabilidades com consciência e liberdade.
Aos educadores urge exercer a mais fina tarefa educativa: o diagnóstico pedagógico, como fez a educadora do nosso exemplo. Descobrir os talentos dos estudantes e desenvolver suas excelências pessoais faz parte do ofício de ser professor. Em um grupo onde poucos são excelentes, há o risco tanto da vaidade como da inveja e ciúme, que geram agressões e desrespeito. Em outro grupo, onde cada um se percebe e é reconhecido excelente em uma determinada tarefa, alguma coisa que cada um faz muito bem feito, há o desenvolvimento de uma cultura de interdependência, de respeito mútuo, de valorização das diferenças. É importante o conceito de competição dado por Viktor Frankl: “que cada um dispute mais consigo mesmo que com os outros”, cada um deve ser melhor que si mesmo.
Um exemplo: em uma escola, um grupo de adolescentes fez um vídeo como trabalho de artes muito bom tecnicamente: imagens, edição, som, abertura, finalização, créditos, porém o conteúdo estava muito agressivo e mostrava o bullying como algo normal. A intervenção da escola foi, além de uma reunião particular com cada aluno e sua família, incentivar os alunos deste grupo a fazer outro vídeo mostrando o “outro lado da moeda”. O novo vídeo foi então apresentado publicamente em uma mesa redonda sobre violência e fraternidade, promovida pela escola. Além disso, foram convidados e agora fazem parte da equipe de filmagem e reportagem desta escola: foram descobertos talentos para repórter, cineasta, diretor...
Acreditamos que são três os fatores que intervém no desenvolvimento da personalidade: o dado, herdado; o apropriado, aprendido, adquirido socialmente; e o autodeterminado, a capacidade humana de assumir uma postura livre, deliberada e de escolha diante do herdado e do meio. Não só o dado, o herdado geneticamente, como também o adquirido, o apropriado socialmente interferem no nosso modo de agir. Condicionam mas não determinam, pois o terceiro fator, o autodeterminado, fruto da escolha consciente da atitude que podemos e devemos tomar diante da nossa história pessoal é o que realmente determina as atitudes e a personalidade. É preciso ampliar a ideia de que somos fruto somente das nossas heranças e influências sociais e educacionais. Somos mais: podemos escolher ser diferentes apesar das nossas heranças e influências. Precisamos infundir no entendimento tanto do estudante agressor como do agredido que eles não precisam agir como seu meio (agressor) ou ficar “eternamente” marcado pelo trauma sofrido (agredido). Ambos podem mudar sua história para melhor, pois “possuem forças insuspeitadas para fazer frente às dificuldades da vida”.
Neste processo, a família tem papel insubstituível, assunto para outro artigo.
E para finalizar, cito uma frase de Viktor Frankl escrita logo após ter sido liberto dos campos de concentração nazistas, ao final da II Guerra Mundial, onde salienta que mesmo sendo “objetos” do poder, da violência, da arbitrariedade e da injustiça, não podemos nos tornar “sujeitos” dentro destas mesmas categorias.
“Ninguém tem o direito de praticar injustiça nem mesmo aquele que sofreu injustiça”.
Se quisermos verdadeiramente contribuir para a cultura da paz, devemos exercer o mais alto sinal de poder: o perdão!
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